
A gente nem se dá conta, mas é muito comum colegas saírem de um evento que durou três dias direto para um bar chorar suas pitangas um para o outro, reclamar, lamentar e até esbravejar sobre suas condições de trabalho, sobre como se sentem injustiçados pelo que receberam para uma jornada tão extensa, sobre situações de racismo e/ou machismo estruturais, etc. É também muito comum que nas reuniões com colegas de profissão todas essas questões sejam novamente levantadas com urgência, indignação, mas também com cansaço. Depois de cada uma dessas reuniões os colegas voltam para casa até começar tudo denovo no outro dia. Isso ocorre porque essa indignação, essa urgência, e até o cansaço, são (ainda) individuais, mesmo quando compartilhados num bar ou numa reunião específica, e deixam escapar a visão de conjunto, ou seja, que essas questões são estruturais e afetam a “categoria”, o conjunto de pessoas que exercem uma mesma atividade profissional.
Para você, esse bar e/ou reuniões são familiares? Eu diria que todo assalariado/a, autônomo/a, informatizado/a, trabalhador eventual, todes transitam por essas cenas. Acredito que essa situação (só) muda quando a consciência de classe passa a fazer parte dessas conversas, ou seja, a consciência do quanto vale o seu trabalho e que esse valor é subtraído pela informalidade e pela precarização, pela falta de direitos, para gerar mais valor e mais lucro para quem te contrata. Isso não tem a ver (só) com você. Na real, você faz parte de um conjunto de colegas da mesma atividade profissional sujeitos às mesmas situações, uma categoria que é mais forte quando mais unida. Essa consciência de classe é o combustível para a organização coletiva que dá à categoria o poder para fazer acordos, conquistar direitos e fiscalizar.
Um exemplo: Quem trabalha em eventos nos dias de hoje nem pode imaginar que um dia a segurança dos eventos, festas e casas noturnas era feita por homens recrutados em academias de artes marciais, conhecidos como “leões de chácara”. É claro que estamos falando de uma época em que as atividades profissionais de Vigilância e Segurança ainda não eram regulamentadas nem fiscalizadas, consequentemente, o mercado definia quem e como contratar, a jornada de trabalho e quanto pagar.
Você pode perguntar: mas o que têm a ver as atividades de Vigilância e Segurança e a Graxa, a técnica, o backstage dos eventos? Os Vigilantes foram igualmente precarizados, invisibilizados, sem uma entidade de classe para representá-los. As empresas de vigilância e segurança pagavam aos empregados ¼ do que recebiam para prestar o serviço. Você também já deve ter visto isso em algum evento onde trabalhou. Eles também enfrentaram a falta de regulamentação profissional, as dificuldades de organização, a resistência à mobilização, o medo de retaliações e os rumores de que a formalização e a conquista de direitos podem causar falência e gerar demissões.
Como essa categoria adquiriu autoridade e poder para negociar e conquistar direitos? A resposta é simples (o que não quer dizer que seja fácil): graças à organização coletiva! Essa que não é concedida, não é autorizada, é conquistada. Por isso mesmo, não é fácil obtê-la, mas sem ela, nada se conquista no mercado do trabalho.

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